GUIA PRÁTICO PARA ELABORAR SUA MONOGRAFIA

20/02/2015 10:00

GUIA PRÁTICO PARA ELABORAR SUA MONOGRAFIA

 

 

Pretendo formular neste pequeno guia algumas recomendações essencialmente práticas em intenção daqueles que devem escrever artigos, ensaios, monografias, papers acadêmicos e assemelhados, sem nenhuma pretensão à originalidade, porém. Como existem dezenas de guias do gênero, pretendo simplesmente escrever com base nessas diversas recomendações e efetuar uma síntese dos manuais mais habitualmente usados e disponíveis na Internet (mas, ao meu estilo). A maior parte desses guias e manuais práticos está em inglês, como se pode verificar pela lista que agrego in fine, e aos quais os interessados em maiores desenvolvimentos poderão recorrer.

 

1. O que significa uma monografia acadêmica?

 

Trata-se de um trabalho com finalidades “científicas”, numa acepção lata do termo. Ou seja, a exposição de um problema qualquer com relevância para o estudo ou aplicação prática na vida cotidiana (ou até para especulação “filosófica” ou deleite literário), com algumas regras indispensáveis ligadas ao formato e à elaboração desse tipo de trabalho. Em primeiro lugar, o trabalho deve enfocar uma descrição a mais acurada possível do problema, ou objeto, escolhido. A descrição deve ser clara, o mais possível exaustiva ou completa (sem ser redundante), seguida de uma discussão desse problema, para fins de conclusões baseadas numa certa racionalidade lógica, isto é: expusemos isto, discutimos suas implicações e chegamos a estas conclusões.

 

Deve-se evitar um jargão excessivamente pedante, ou ultra-especializado, e procurar utilizar-se de conceitos usualmente aceitos pela comunidade acadêmica e também por um público cultivado, uma vez que uma monografia acadêmica sempre visa um conhecimento especializado (mas compreensível a quem não é da área). De preferência se deve adotar uma linguagem enxuta, próxima do ideal de Graciliano Ramos: uma vez terminado de redigir um texto, devemos voltar atrás e começar a eliminar todos os adjetivos supérfluos, todos os argumentos impressionistas ou puramente “literários”, e buscar reduzir o texto à sua essencialidade básica: expor o problema, discutir suas implicações, chegar a conclusões claras, sem mais floreios ou redundâncias. Ou seja, quanto menos palavras melhor, ou dito em linguagem popular: não fique “enchendo lingüiça”, nem dando espaço dois para “aumentar” o texto.

2. O formato ideal de uma monografia acadêmica

 

Como deve ser organizada uma monografia acadêmica para atender aos requisitos do gênero?

 

Muito simples, ela deve pautar-se pela conhecida fórmula IMAC: Introdução; Metodologia; Apresentação (ou Análise) do Problema; Conclusões. A rigor, ela conterá também a bibliografia, que é de rigor em qualquer trabalho acadêmico, mas isto é um suposto básico de qualquer trabalho do gênero.

 

O que deveria conter cada uma dessas partes?

 

 

Introdução:

 

Depois de fazer um eventual prefácio – agradecendo a Deus, aos familiares, aos professores e a tutti quanti colaboraram com o seu trabalho (o que é absolutamente dispensável, mas respeitemos esse direito do autor) –, o candidato a acadêmico deve, simplesmente, dizer o que pretende fazer ou oferecer com o trabalho. A rigor, bastaria uma simples descrição esquemática do que pretende ser o trabalho. Mas pode também conter uma justificação da escolha daquele tema, sua relevância ou legitimidade para a área de pesquisa em causa, e dizer (antecipando, digamos assim), aonde se pretende chegar com o trabalho em si; ou seja, sua contribuição para o estudo daquele tema. A descrição esquemática pode conter uma breve exposição do que conterão os diferentes capítulos – na parte de Apresentação do Problema – mas isso a rigor também é dispensável. O essencial deve ser dito em poucas palavras.

 

Escusado dizer que essa Introdução será escrita em último lugar, para que ela seja um retrato fiel do corpo do trabalho, e não um anúncio grandiloqüente que depois não é confirmado pelo desenvolvimento do tema. Essa introdução, finalmente, servirá para compor o resumo inicial e as palavras-chave, indispensáveis (em inglês também).

 

Metodologia:

 

Trata-se, basicamente, de descrever a abordagem utilizada na monografia, ou paper. Ou seja: método histórico-dedutivo, analítico-conceitual, expositivo-crítico, ou qualquer outro que o autor decida, segundo alguns manuais do gênero (e a possível orientação do professor de metodologia). O autor dirá aqui como ele abordou o tema de sua preferência e por que escolheu aquele método e não outro. Poderá discorrer, eventualmente, sobre métodos alternativos, não usados; mas isso não é necessário.

O “método” a ser descrito nesta parte é um pouco a famosa “fundamentação teórica”, que muitos professores exigem dos candidatos, como se fosse um elemento absolutamente indispensável do trabalho acadêmico, o que nem sempre é o caso. Ou seja, o trabalho pode ser – este é um direito do candidato – simplesmente expositivo-descritivo, sem referência a qualquer autor famoso na comunidade acadêmica, posto que o tema escolhido se presta, hipoteticamente, a uma descrição empírica de fatos da vida real, ou que o autor tenha decidido, por exemplo, fazer uma síntese da literatura existente a respeito do seu tema, sem maiores inovações teóricas. Por isso alguns alunos tropeçam nessa parte, e acabam escrevendo uma “metodologia” que tem pouco a ver, finalmente, com o conteúdo em si do trabalho.

 

Resumindo: metodologia é simplesmente a forma como o autor organiza os seus dados, seus materiais primários, seus elementos empíricos, e até suas leituras, e os apresenta em seguida na discussão fundamentada da terceira parte, com análise crítica e um levantamento de outros problemas que tenha detectado em sua pesquisa. O autor pode, também, aproveitar essa parte para dizer como outros analistas do mesmo problema estudaram a questão, se concorda com eles, se utilizará métodos já empregados anteriormente, etc.

 

 

Apresentação (ou Análise) do Problema;

 

Aqui está, obviamente, a parte principal do trabalho, a que justifica todo o esforço do autor, e por isso mesmo deve ser objeto de um cuidado redobrado na sua organização e estruturação. Normalmente, uma monografia acadêmica – que sempre é algo maior do que um simples paper, ou artigo – encontra-se organizada em capítulos (eventualmente distribuídos em partes e subdivididos em seções). A maneira mais simples de organizar uma monografia seria numerar sequencialmente cada uma das unidades, de forma simplesmente linear: 1 para a Introdução, 2 para a Metodologia, de 3 a 5 (ou mais) na parte central do seu trabalho, que é esta que nos ocupa agora.

 

Pode-se organizar todo o trabalho em partes, ou seja, uma primeira parte para os “prolegômenos” (Introdução e Metodologia); uma segunda parte para a Análise, propriamente dita (com tantos capítulos e seções quanto requeridos pela pesquisa do autor e sua própria organização dos materiais); e uma terceira parte de Conclusões. Isso não impede a numeração seqüencial dentro das partes, e seria até recomendável que assim fosse feito, uma vez que a numeração linear dos capítulos facilita muito a elaboração do trabalho e a própria leitura do trabalho.

Mas deixando de lado essa questão puramente formal, vamos nos concentrar no que deve conter uma apresentação ou análise da problemática escolhida pelo autor. A descrição exaustiva – ainda que resumida – do problema selecionado é necessária, para que se possa julgar, a partir de elementos concretos, da capacidade de leitura, de pesquisa, de apreensão-compreensão do tema que o candidato escolheu para debater. Uma volta à literatura existente nessa área – eventualmente já apresentada na seção de metodologia – pode ser útil, para indicar não apenas pesquisa efetiva e leitura atenta dos “antecessores” do autor no tratamento daquele problema.

 

Pode-se escolher fazer um retrato muito amplo do problema – começando na idade da pedra, por exemplo – mas o ideal é que a apresentação se limite ao essencial, pois se supõe que os leitores da monografia – que são “atentos” professores, velhos “conhecedores” do problema – já saibam que “antigamente” os homens eram todos uns ingênuos e que, só a partir da Revolução Industrial, da Revolução Francesa, ou de qualquer outro evento genial na história da humanidade, eles despertaram para o conhecimento e o saber... Enfim, isto para dizer que você não precisa dar voltas pela Grécia clássica para enfrentar o “seu” problema, que supostamente é contemporâneo.

 

Descreva, em palavras secas, à la Graciliano, o que você tem a dizer, e não tente enrolar o seu orientador com aquela “encheção de lingüiça” que só serve para rechear páginas e páginas de verbosidade inútil e aborrecida. Apresente os dados do problema e diga como se deve interpretá-los (ou como autores mais “sábios” do que você os interpretaram anteriormente, geralmente professores que já publicaram extensamente nessa área). Não é preciso dizer que você precisa colocar entre aspas tudo, absolutamente tudo, o que você recolheu nas fontes “primárias”: qualquer tentativa de enganar a “autoridade” nesse particular é punível da forma mais estrita, como crime suscetível de flagelação em público, por fraude ou plágio deliberado.

 

Por isso, não faça glosa, reescrita, ou copy and paste do que você encontrar por aí: transcreva honestamente tudo o que você recolheu da “inteligência” (ou falta de) de outros autores e dê o crédito a quem merece (sim, você pode aproveitar para criticar a “ingenuidade” de autores que o precederam na gloriosa tarefa de explorar aquele tema). Não se paga direito autoral por reconhecer a anterioridade de idéias já circulando no mercado e você deve reconhecer os direitos morais de autores que se especializaram naquele tema por você escolhido. Todos os dados (ou números) devem ser checados; para isso, indique claramente todas as fontes utilizadas, mesmo quando elas são de domínio público (IBGE, por exemplo).

Uma vez apresentados os dados, os argumentos, a problemática em questão, está na hora de você discutir esses elementos, analisar seu impacto ou implicações para a área ou contexto nos quais o seu problema se insere E tentar inferir resultados desses problemas detectados (em princípio situados no “passado”, em face das novas “perspectivas” que se abrem a partir do seu trabalho). Ou seja, você vai “discutir” os seus dados, qualquer que seja o sentido desta “discussão”. Você pode concluir, por exemplo, que aquela área é carente de regulação legal, e que o Estado deveria, supostamente, suprir essas lacunas (oportunamente já detectadas por outros autores, o que você deve também referir).

 

Eventualmente, a discussão efetuada leva o problema a alguma generalização

 

– casos semelhantes ocorridos em outros contextos, ou em perspectiva comparada (com outros países, por exemplo) –, ou você pode proceder por “analogia”, ou seja, por aproximação a outros casos detectados em outras situações e que podem servir como modelo ou base empírica para alguma sugestão na área de que se ocupa seu trabalho. Evite, porém, redundâncias, ou seja, não fique repetindo, em seções diferentes, as mesmas “descobertas” feitas por você ou outros autores: essa é também outra forma de “encher lingüiça”, ainda que de maneira substantiva.

Importante: não tente esconder dados, ou argumentos de outros autores, que se oponham ou que confrontem, ainda que parcialmente, aos seus próprios argumentos. Uma exposição honesta dessas visões “divergentes” é mais relevante do que uma tentativa de “harmonia”, ou de unidade analítica, artificialmente construídas. Alguns dados poderão ser considerados uma “exceção”, mas isso precisa emergir da própria exposição completa do problema, não de uma seleção arbitrária das “perspectivas convergentes”, à exclusão dos “elementos discordantes”. Por isso, uma revisão ampla da literatura é necessária para identificar pontos de vista contrários e argumentos que destoem do sentido geral que você pretenderia dar ao seu trabalho. Melhor concluir pela impossibilidade de “conclusões” do que tentar escamotear problemas evidentes que surgem do próprio enunciado contraditório do problema. E com isso chegamos ao item final de nosso “guia”.

 

Conclusões:

 

Muito simples: se trata, geralmente, de um resumo da parte anterior, ou seja: uma revisão geral dos argumentos apresentados nos capítulos anteriores e um ensaio de conclusão geral. O que é uma conclusão?


Em primeiro lugar, é uma síntese dos “achados” – findings, como se diz na linguagem acadêmica americana – o que significa expor as “descobertas” que você fez (não necessariamente originais, no sentido de Colombo, mas pelo menos de uma forma nova). Desses resultados você pode tirar “recomendações” para as autoridades (quanta pretensão, não é mesmo? Mas você não precisa ser modesto aqui, à condição que tenha mesmo conclusões interessantes para apresentar).

 

Discuta o que significam esses resultados, para a literatura da área, para a realidade em questão, para o trabalho legislativo, paras as medidas dos policy-makers. Esta discussão poderá já figurar na última parte da seção (ou parte) anterior, mas você pode reservá-la para as conclusões, como uma espécie de grande finale. Se você tiver algo de inteligente a expor, diga-o claramente, pois sua monografia poderá ganhar um desses prêmios que se prometem aos alunos mais aplicados.

 

Depois de tudo isso, você ainda precisa voltar e escrever a Introdução, fazer o resumo (absolutamente claro quanto ao objeto e conclusões), agradecer a Deus, etc. Não se esqueça de revisar a bibliografia, colocar as notas em ordem, segundo o padrão da ABNT (o que é sempre uma chatice), e rever cuidadosamente a linguagem

 

– recorra a um parente mais velho, se o seu Português é destes tempos de incultura generalizada – antes de imprimir e depositar. Um texto mal escrito, mal revisado, um trabalho mal organizado e pobremente apresentado, indispõe seguramente os seus leitores, que vão para a banca de mau humor.

 

3. O que fazer da sua monografia?

 

Bem, você chegou ao termo de um extenuante processo de pesquisa, garimpo de dados, compilação de argumentos de outros autores, redação cansativa de um texto que precisa ser constantemente revisto – se o seu orientador fizer o trabalho que lhe compete, honestamente – e o realinhamento de parágrafos (aí sim, na base do cut and paste), e aguarda ansiosamente a defesa da monografia e a proclamação do brilhante resultado: aprovado suma cum laude (nem toda instituição cultiva estes bons valores de antigamente). Você trabalhou durante meses – ou anos – pela sua monografia; pois agora é hora de fazê-la trabalhar por você (em especial para o seu futuro profissional).

 

Pois tenha isto bem presente, no momento mesmo em que for escolher um tema para trabalhar: ele vai ser um irmão maior – às vezes menor, e muito chato – por um longo tempo (mais até do que você pensa, se alimenta essa idéia que a monografia é apenas uma obrigação “chata” e que é preciso deixar para trás o quanto antes).

Uma monografia pode ser uma importante alavanca no seu futuro profissional e até mesmo lhe garantir um emprego bem pago. Assim, ponha a mão na consciência e diga a si mesmo: eu quero fazer um trabalho que discuta um problema relevante, com argumentos originais (não precisam ser todos seus, mas dê o crédito, por favor), e apresenta resultados derivados diretamente da discussão efetuada, eventualmente com a apresentação de “soluções”, ou sugestões, que encantarão os seus leitores (e futuros empregadores).

 

Dessa monografia poderá resultar um livro ou mais publicações (artigos em revistas, por exemplo), embora eu esteja certamente exagerando. Mas nunca é demais sonhar e, sobretudo, trabalhar ativamente para que isso se realize. Por isso, trabalhe bastante suas conclusões e aqui, sim, você poderá ser um pouco redundante: elas poderão aparecer já na parte final da discussão (ou Apresentação e Análise), nas conclusões, propriamente, e na Introdução do trabalho, quando não, de forma obviamente ultra-resumida, no resumo inicial (abstract).

 

Nesse sentido, a sua Introdução pode servir como apresentação geral do trabalho, para fins de marketing e oferecimento ao mercado. Por isso, exponha com clareza o objeto do seu trabalho, a relevância do tema pesquisado e discutido, cite os autores mais importantes que embasaram sua análise, eventualmente a metodologia, antecipe os argumentos principais da discussão e resuma, de forma compreensível (isto é, racionalmente), as conclusões a que você chegou. Se você produziu uma obra original, não seja modesto; diga isto logo de cara, mas tenha cuidado no auto-elogio, sobretudo se ele for imerecido: uma pesquisa no Google Scholar poderá indicar os 15 mil artigos que existem sobre aquele mesmo assunto. Você não precisa ser tímido, mas também não se ache o novo Cristóvão Colombo.

 

Finalmente, se quiser seguir um pequeno conselho simpático, enfeite o início do seu trabalho com uma dessas frases geniais de algum cientista ou filósofo famoso, ou coloque uma pequena poesia ou canção popular na página anterior ao sumário. Se for verdadeiramente inteligente, a transcrição desse trecho, ou frase, fará sorrir o seu leitor, que já lhe dará alguns pontos pela graça da iniciativa. Mas, por favor, escolha coisas inteligentes, pois a televisão e a vida política já estão cheias de banalidades...

 

Seja feliz na sua monografia e tire proveito dela assim que puder!

 

Paulo Roberto de Almeida